quinta-feira, 9 de março de 2006

Isto ainda vai dar merda

Historicamente a situação entre a China e o Japão nunca foi muito confortável. Especialmente depois de o Japão ter invadido a China durante a II Guerra Mundial. Parece que os chineses levaram a mal uma série de coisas, certamente sem importância, que os japoneses fizeram por lá. E o simples facto de ver o seu país invadido tem a tendência para deixar as pessoas mal-dispostas. Seja como for, a II Guerra Mundial já foi há uns tempos, por isso era de esperar que já fossem todos amigos. Mas não, nada disso. Nisto de invasões e crimes de guerra, as coisas tendem a ficar na memória, mesmo de quem ainda não era nascido na altura.

E como tal, nos últimos tempos os dois países têm trocado picardias que têm subido de tom, embora ainda se mantenham no nível "tu és mau e se continuas a ser mau deixo de falar contigo", não tendo ainda chegado ao ponto do "se te oiço dizer mais uma ???aladoarda???? dessas vou aí parto-te a tromba toda e mato o teu cão". Felizmente, porque a China entreteve-se desde o fim da II Grande Guerra a construir um bonito arsenal, cheio de aviões, barcos, e equipamento diverso que inclui armas atómicas de belo efeito. E o Japão tem uma coisa a que chamaram Forças Japonesas de Auto-Defesa que foi o que se conseguiu arranjar depois de os EUA ter invadido. Esta força de defesa tem a particularidade de estar proibida pela Constituição de fazer guerra contra outros países. O que pode ser aborrecido em determinadas situações. No entanto, existe uma outra coisa que sempre transmite uma certa sensação de conforto que é um acordo entre o Japão e os EUA e que se chama algo como Tratado de Cooperação e Segurança Mútuas e que basicamente diz que se alguém bater no Japão este vai chamar os EUA. O contrário não é verdade por causa daquele artigo curioso da Constituição e que eu já referi. E ainda bem para o Japão, caso contrário não faziam outra coisa que não andar a correr atrás das forças dos EUA.

Mas disperso-me. Eu estava a falar era das recentes picardias entre a China e o Japão. Segundo me lembro, se bem que devem ter havido muitos outros eventos anteriores, esta história começou por causa de um manual escolar japonês que a China acusou de ser revisionista em relação ao que o Japão fez na China durante a II Grande Guerra. Mais recentemente houve uma outra questãozita que os chineses levaram a mal e que foi uma visita do Primeiro Ministro Junichiro Koizumi, ao templo Yasukuni que honra as 2,5 milhões de vítimas japonesas da guerra, com o pormenor de lá estarem enterrados 14 criminosos de guerra japoneses que foram enforcados e tudo. O Governo chinês disse que era estúpido e amoral venerar criminosos de guerra. Os japoneses por seu lado ficaram chateados porque estúpido e amoral não é coisa que se chame a um Primeiro Ministro.

A última troca azeda de palavras foi desencadeada por um "deslize" freudiano do Ministro dos Negócios Estrangeiros japonês, que se referiu a Taiwan como país. Ora como muito bem sabemos, a China continua a considerar Taiwan como parte do seu território. Embora exista um tratado assinado entre China e Japão em 1972 em que os últimos reconhecem que existe apenas uma única China.

Mas se tudo isto parecem coisas ligeiras para que possa vir a haver um conflito entre estes dois países asiáticos, então o novo pomo da discórdia talvez faça mais sentido. Existe um sério desacordo entre Japão e China no que diz respeito à definição dos limites das respectivas Zonas Económicas Exclusivas (ZEE).



E o problema nem sequer diz respeito a direitos de pesca, como no caso de Portugal e Espanha. Neste caso podemos construir um paralelo com o histórico Tratado de Tordesilhas. A questão de se chegar a divisão das fronteiras atribuídas a cada um dos países um bocadinho mais para a esquerda ou mais para a direita não é completamente inocente. Se no caso da divisão do Mundo entre Portugal e Espanha, a hábil alteração às linhas iniciais nos deu o Brasil, a definição da fronteira da ZEE que o Japão persegue pode-lhe dar acesso a reservas de gás natural, que a China tem vindo a explorar e às quais o Japão certamente não se importaria de deitar a mão ou pelo menos, de partilhar com a China.

A minha dúvida relativamente a tudo isto é se todas estas quezílias a que temos assistido nos últimos anos não serão apenas fait-divers, jogadas de distracção num jogo de weiqi (go) de âmbito regional com o objectivo final de conquistar importantes reservas energéticas.

BBC NEWS | Asia-Pacific | Japan-China row turns to Taiwan

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