sábado, 24 de julho de 2004

Java e Open Source



Já por várias vezes que tentei entrar na linguagem de programação Java. Tentar perceber os fundamentos, os conceitos e o modo de programar em Java tem-se mostrado uma tarefa algo complicada para mim. O Universo Java, que abrange muito mais que a simples programação, lembra-me de alguma forma a experiência que se tem com a comida indiana. Quando se leva uma garfada à boca, parece que um batalhão de formigas iniciou uma caminhada dessincronizada pela nossa língua. Tentar perceber todos os ingredientes utilizados é uma tarefa confusa, com cada pequeno sabor a chamar-nos a atenção de forma aleatória e desviando-a dos outros, para logo depois se voltar a esconder por detrás da multidão. Olhando para o Universo Java sinto exactamente a mesma coisa. Há tantos conceitos, tantas novas ideias, tantos projectos a despontar em simultâneo, que uma pessoa tem tendência a tentar abarcar tudo de uma só vez e acaba por ficar apenas com uma certa frustação. Mas uma ideia clara me fica quando observo de longe, quer o Universo Java, quer o Universo Open Source. Ao contrário do mundo Microsoft que convida as pessoas a aderirem à Corporação, a filosofia Java e Open Source é uma concretização webiana de um slogan activista já muito batido mas pouco levado à prática:

Power to the People!


domingo, 11 de julho de 2004

A Sorte Grande

Parabéns Sr. Lopes, saiu-lhe a Sorte Grande.

A decisão de Durão Barroso de aceitar o cargo de Presidente da Comissão Europeia foi a melhor coisa que alguma vez podia ter acontecido a Santana. De outra maneira jamais conseguiria chegar ao cargo de Primeiro Ministro de Portugal, a que acede por cedência. Não acredito que numas eleições antecipadas ou mesmo nas legislativas daqui a dois anos pudesse chegar ao Governo. Ou sequer à liderança do PSD. Para além disso, passando pelo cargo de Primeiro Ministro, Santana coloca-se ainda melhor naquele que é o seu grande objectivo em termos de carreira política: chegar a Presidente da República. Portugal demonstraria assim que o Complexo de Pedrito pode ser levado até às últimas consequências.

Não discuto a decisão do Presidente da República. A argumentação apresentada pela esquerda nunca me pareceu muito válida. O Presidente não podia dissolver a Assembleia da República só por não gostar de Santana. E é garantido que não gosta. Tão pouco poderia dissolver a Assembleia por não estar de acordo com a política seguida pelo Governo ou com o seu programa eleitoral. E penso que será seguro admitir que não está. A questão é que não é o papel do Presidente julgar o Governo, esse é o papel do povo. E esse exercício é levado a cabo de quatro em quatro anos nas Eleições Legislativas. O que me espanta é que o quadro que levou a toda esta crise não esteja bem definido, ou seja, em caso de demissão do Primeiro Ministro ou mesmo de incapacidade física ou de outra ordem para permanecer no cargo, devia haver uma solução clara para a situação sem que fosse necessária toda esta comoção. Não devia ser necessário ouvir dezenas de entidades para se chegar a uma conclusão. Os EUA têm a figura do vice-presidente que tomará o lugar em caso de impedimento por parte do presidente. Talvez devessemos ter uma figura semelhante, sempre se poupava a incerteza neste género de situações.

É claro que para a Esquerda este momento era o ideal para levar a cabo eleições antecipadas. A popularidade do Governo está muito baixa e dificilmente, coligados ou não, o CDS e o PSD conseguiriam nova maioria. Mas novamente, o papel do Presidente da República não é o de dar o jeitinho à Esquerda, como tão pouco será o de dar o jeitinho à Direita. Segundo julgo perceber, o papel do Presidente da República é o de ser o garante das instituições democráticas. Sampaio deixou bem claro que o faria, controlando o desempenho do novo Governo no sentido de verificar se o programa de Governo será respeitado, como foi prometido por Santana. Mas isso cria uma situação curiosa. Em circunstâncias normais, os governos exercem o seu poder fazendo uma interpretação liberal do programa apresentado durante a campanha eleitoral. Por vezes, o programa eleitoral não é tido nem achado durante o período de governação. E no entanto, a este novo governo, formado nestas circunstâncias, será exigido que faça o que o outro não faria. Estou curioso em saber como se processará este controlo presidencial durante os próximos dois anos.

Quanto a Durão...bem, Durão ganhou vários jackpots e aparentemente também um belo prémio da Lotaria com o pedido que lhe foi feito para aceitar o cargo de Presidente da Comissão Europeia. Para começar dá um excelente passo na sua carreira política, passando para representante máximo do orgão mais importante da União Europeia. Para Durão, que sempre guardou junto ao seu coração, o fascínio pelos seus dias como Ministro dos Negócios Estrangeiros, este deveria ser um cargo extremamente apetecível. Possivelmente seria objecto dos seus sonhos mais húmidos. Esta deve ser, portanto, a concretização de um sonho. Para melhorar a coisa, nunca se submeterá ao julgamento do povo, escapulindo-se às Legistativas de 2006. Poderá sempre lavar as mãos dos resultados dessas eleições, caso venham a ser prejudiciais ao PSD, ou tomar parte do crédito, se pelo contrário e muito ao contrário do que se espera, as Legislativas reconfirmarem a maioria do PSD ou da coligação. Mas o resultado prático é que mesmo a hipótese de sair derrotado de umas eleições nunca se concretizará. Podem vir a debater-se durante semanas a fio os dois primeiros anos do Governo de Barroso, mas serão sempre discussões académicas, porque a realidade é que quando o povo se pronunciar, já não será sobre Durão. Tudo isto, em termos de carreira política, é ouro sobre azul.

Durão safou-se a uma derrota em 2006, mas não se safa disto: ao decidir aceitar o cargo de Presidente da Comissão Europeia, demonstrou sem margem para dúvida que a sua carreira estava acima de Portugal. Se realmente quisesse lutar pelo seu país teria feito o que o seu homólogo luxemburguês fez. Recusava a oferta para honrar o compromisso que tomou com quem o elegeu. Durão demonstrou, sem margem para dúvida, que se está nas tintas para o futuro de Portugal.

sexta-feira, 9 de julho de 2004

Genebra vs Guantanamo

Actualmente vive-se uma situação insólita na base militar que os Norte-Americanos mantêm na Baía de Guantanamo em Cuba. Como consequência do ataque militar ao Afeganistão, efectuado na sequência do atentado de 11 de Setembro contra as torres gémeas de Nova York, foram detidos mais de 600 homens, actualmente 595, considerados "combatentes ilegais". Esta classificação foi avançada (inventada?) pela Administração Bush como forma de retirar a estes homens os direitos e protecções garantidos pela Convenção de Genebra a todos os prisioneiros de guerra. Esta convenção foi assinada também pelos EUA em 1949 e reconhece a todos os prisioneiros de guerra o direito a um tratamento humano, define as condições mínimas de higiene e saúde que devem ser garantidas aos prisioneiros e proíbe práticas como maus-tratos e torturas.

Estes homens estão detidos sem acusação formal, sem acesso a advogados e há relatos de maus-tratos infligidos durante estes quase três anos de detenção. Alguns destes prisioneiros, demonstrando sinais de extremo desespero, chegaram a atirar-se contra o arame farpado. A detenção destes homens, independentemente da qualidade dos seus actos durante a guerra, torna-se ainda mais preocupante quando são conhecidos documentos da Administração Norte-Americana que procuram identificar situações em que a utilização de torturas seria justificável ou não-ilegal.

Ainda que num plano estritamente formal se pudesse argumentar(1) que em situações em que a Convenção de Genebra não é aplicável, a prática de tortura não é ilegal, essa é, ou devia ser, uma discussão puramente académica. A realidade é que quando os EUA assinaram a Convenção, estavam a reconhecer que em termos morais a prática de torturas não é justificável. Mesmo em situações extremas como é o caso uma guerra. Isto, claro, para além de aderir a um acordo internacional que protegeria o seu próprio pessoal militar.

Ao procurarem encontrar caminhos que permitam a tortura em situações pontuais, mais não estão a fazer que contribuir para o retrocesso civilizacional e dos direitos e garantias conquistados pela Humanidade durante o século passado.

E se os EUA podem decidir, discricionariamente, sobre quando a tortura é ou não é justificável e ninguém levantar a voz contra isso, quem poderá condenar, por exemplo, os resistentes iraquianos que viram o seu país ilegalmente invadido pelos EUA?

(1) - por hipótese. Na realidade não faço ideia se existe algum argumento jurídico que possa ser usado para legitimar a tortura. Assim de repente eu diria que não, mas posso estar enganado.

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